Na continuação do tema individualidade vs. comunidade, compartilho aqui mais uma anedota.
Fui almoçar com a família. Como todo descendentes de italianos, falava-se muito à mesa, e a comunicação não se restringia ao uso do português falado. Eram gestos com a mãos e expressões faciais, daqueles que só o nosso subconsciente sabe registrar. Entre uma frase e outra, um termo em inglês qualquer, e a certeza que todos ali compreenderam o que se passava. Afinal, além da Itália, haviam influências da América do Norte, Inglaterra, França, e Japão entre nós. Mundo globalizado este.
A atmosfera no restaurante se originava inconfundivelmente da artificialidade do franchising norte-americano com uma pitada de globalização. Persianas de madeira estilo americano colonial enoiteciam o ambiente, cortando o sol tropical que rajava lá fora. Pingentes de luz desciam do teto em cima de cada booth com mesinha, iluminando somente o necessário para ler o menu. A organização dos pratos no menu lembrava os diners americanos, o que destoava da influência inglesa no estofado rebitado de couro. Aquele era um restaurante temático, futebol o tema. Enfim, algo proveniente do Brasil ali. Já estava ficando chato.
A garçonete que chegava nos resgatou da plasticidade do ambiente. Uma morena bem vestida e com cabelos trançados à pocahontas, veio trazer brasilidade para aqueles que já esperavam uma loira para nos servir. Muito prestativa, atenciosa, e simpática, anotou todos os pedidos e atendeu as solicitações de mudança em um dos pratos. Mudanças que não seria aceitas com facilidade e cordialidade na América do Norte. Prato padrão com atendimento padrão. Vida padrão.
A comida chegou. Ali tinha de tudo, desde massas ao molho branco ao churrasco com legumes e purê de batata. Todos aclamando a qualidade da comida, que ainda trazia a apresentação típica norte-americana em pratos individuais. Numa fração de segundo, tudo mudou. Ofereceram-me um pedaço de comida do outro prato e fui pego de surpresa: compartilhar a comida era um hábito que já não possuía mais. Permitir aos outros que tenham experiências com aquilo que é seu, oferecendo de si para os outros. Gostei da ideia e aceitei, a comida estava realmente uma delícia.
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