2013-03-03

361 dias

Quarta-feira, 7 de Março.  Dia de sol.  Abria-se a porta e aquele som de lata de palmito fazendo tac anunciava que o ar lá de fora, quente como vapor, entrava no frio gélido de uma outra lata, o avião.     Ao primeiro passo fora do recinto, mal sabia que entrava agora em um outro mundo, onde os valores eram tão diferentes daqueles que havia vivido nos últimos anos.  Chegara, então, em terra brasilis.

Ao final de todo ano, as lojas fecham por alguns dias.  Retira-se o que não será mais ofertado ao cliente, novos produtos ocupam as prateleiras e o estoque é contado e conferido.  Meu ano terminou e, apesar de não ser uma loja, quero aproveitar para fazer o meu balanço.  O mais irônico, ou talvez vantajoso, é que faço este balanço justamente no lugar que deixei, o Canadá.  

Apesar de estar aqui de passagem, a trabalho, aproveitei para rever os amigos que havia deixado a 4 estações atrás. Algumas vidas haviam mudado, outras em status quo -- mas o importante é que continuavam em busca de seus objetivos e sonhos e, que, apesar da distância, ainda sentia que eram meus amigos. Parecia mesmo que eu nunca havia partido. E, como todo amigo que nos quer  ver feliz, a pergunta recorrente era: está feliz no Brasil? o que você gostou? o que você não gostou?  Já havia chegado pensando em fazer o tão famigerado balanço. Tais perguntas só tornavam-o mais evidente.  Era, então, hora de refletir.  Refleti.

Foi um ano emocionante. Aprendi muito sobre a vida, e como aprendi.  Eu queria me aproximar mais do lado humanista que havia perdido com o frio das relações em terras frias.  Sabia que teria tal oportunidade na américa latina e tirei proveito dela. Conhecer melhor a minha família. Entender e até compartilhar dos objetivos de vida dos meus amigos. Descobrir o que motiva as pessoas na vida.  Ver que as pessoas, em seu caminho, são tão diferentes quanto tons de cor em uma pintura impressionista. Aceitar as diferenças. Vi então que a vida não é um projeto com começo, meio e fim onde podemos controlar e planejar as coisas.  O inesperado, o acaso e as coincidências fazem parte e percebi que eu gostava deles.  A vida como ela é, já dizia Nelson Rodrigues.

Conheci um Brasil que havia sido me apresentado somente por terceiros em primeira mão.  Trabalhei lado a lado com brasileiros, conheci o mundo dos negócios, a produção de valor. Vi talento, muito talento. Vi progressistas, pessoas de vanguarda com coragem de inovar, investir e trabalhar. São muitos. Este país que acorda cedo não é tão ruim quanto a imagem que criei dele. Aqui não faltam pessoas trabalhadoras. Percebi, ali, que o desenvolvimento do Brasil não dependia de mais fomento, de mais ações governamentais na indústria para o trabalho. Estes são só fichinhas para trocar por voto. O que falta, no Brasil, é confiança e comprometimento entre as pessoas.  Assunto para outro artigo.

Por outro lado, sobra alegria. O brasileiro sorri à toa. O brasileiro conversa no ponto de ônibus. O brasileiro se relaciona. O brasileiro gosta de ver gente na rua. O brasileiro mostra pro mundo que a vida, já efêmera, perde seu propósito quando vivemos a sós.  Não é o fim, e sim a jornada que importa. E este Brasil, eu não só gosto como amo, abraço e beijo.  Ele faz parte de mim e eu, dele.

Me perguntaram onde estava a tal da felicidade. Respondi que a encontrei no caminho do auto-descobrimento, no inesperado, no mar, na natureza e naqueles que eu amo e que me amam. Coisas que não estão à compra ou venda. Se estivessem, ainda estaríamos procurando.

Por fim, só tenho a agradecer. Obrigado àqueles que estiveram do meu lado em tempos difíceis, nos desafios, nas conquistas. Obrigado àqueles que ofereceram oportunidades de trabalhar, de contribuir, adicionar valor, construir. Obrigado àqueles que compartilharam e dividiram um café, chopp ou biscoito Globo. Obrigado àqueles que me emprestaram o ouvido quando eu precisei.  Obrigado aos que trouxeram boas energias, que desejaram o bem. Obrigado aqueles que doaram sem esperar algo em troca. Lembrei de vocês.